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Beatrice é chefe de marketing em numa companhia de alta tecnologia, estabelecida na Virgínia do Norte. Sua empresa passou por um período de crescimento explosivo, seguido por 12 meses tensos e estressantes, durante os quais perdeu aproximadamente um quarto de seus clientes. Ela se encontra com Mark, seu orientador, todas as sextas-feiras à tarde, durante duas a três horas. Quando começou, a intenção era de estabelecer uma relação de orientação para o desenvolvimento mas, em vista da situação atual da empresa, esse encontro é como uma sessão de solução de problemas. Beatrice valoriza essas conversas porque ela tem a oportunidade de analisar todos os aspectos "vivos" de sua vida de trabalho com alguém de fora – alguém que tem a capacidade de ver as coisas objetivamente e sem paixão. Este é um bom exemplo daquilo que chamamos de "orientação transacional".
Stuart é o gerente geral de uma companhia de produtos para a saúde, estabelecida em Chicago. A empresa dele também teve um crescimento rápido nos últimos anos e, de fato, 2000 foi o melhor ano em termos de indicadores críticos como a participação no mercado, crescimento das vendas, lucros, etc. A companhia está planejando uma nova fusão, envolvendo comunidades de aposentados (que, por brincadeira, chamam de "mini-Disneylândia para idosos"), para o que Stuart já foi identificado como o principal executivo. Em semanas alternadas, Stuart dirige até o centro de Chicago para encontrar-se com Charlotte, uma orientadora executiva que mantém um pequeno escritório próximo à Avenida Michigan. Eles conversam por algumas horas e suas conversações parecem ir em todas as direções. Por exemplo, no ano passado, eles tiveram três sessões consecutivas para falar sobre a filosofia francesa no século vinte e seu impacto sobre o pensamento ocidental. Este é um exemplo de "orientação transformacional".
Aparentemente, tanto Beatrice como Stuart estão obtendo o que desejam de seus orientadores. Eles são dois clientes satisfeitos. Mas os seus orientadores compreendem as diferenças entre orientação transacional e transformacional? Tanto Mark como Charlotte têm bastante clareza sobre o que estão fazendo. Mark ficaria muito desconfortável se tentasse fazer orientação transformacional, embora ele não hesite em denominar a si mesmo um "orientador transformacional." Charlotte consideraria o que o Mark faz uma perda de tempo para ela.
Ken Wilber (1980, 1983, 1999) tem escrito muito sobre "translação" e "transformação" no contexto das mudanças da consciência humana. A figura 1 esclarece algumas dessas distinções. Wilber frequentemente exemplifica a consciência humana como um prédio de muitos andares. A translação é como mover-se dentro de um mesmo andar, ou reorganizar a mobília no mesmo andar. A transformação é como mover-se para outro andar com ou sem a mobília (do 5º para o 7º ou 10º andar), e comprar alguma mobília nova, também. À medida que subimos, num edifício, podemos ver mais, podemos ver coisas que não são visíveis de um andar inferior.
Para tomar um outro exemplo, a religião é muito boa para realizar a função transacional, porque nos dá uma lista do que fazer e do que não fazer – em que deus devemos crer, como orar, o que dizer quando rezamos, o que comer ou beber, etc. A religião, por si própria, não é muito boa em mover as pessoas de um nível de consciência para outro. Esta é a função da espiritualidade ou da prática espiritual, no sentido que Roger Wash (1999) chama de "experiência direta do divino" – que, por sua própria natureza, é uma experiência transformacional.
Embora a transformação, como um processo, pareça mais desejável em alguns modos, essas duas funções são importantes e indispensáveis no desenvolvimento da consciência humana. Nosso processo de socialização, que é guiado por nossos pais e professores, nada mais é do que uma tentativa transacional prolongada. Nossa luta diária para trazer à tona coisas que estão escondidas em nosso subconsciente, ou até inconsciente, é transacional em sua essência. A translação é tão importante que, para alcançar a transformação, nós temos que frustrá-la. Todos nós conhecemos pessoas que nunca mudaram de serviço, que nunca saíram da cidade onde nasceram, e que têm ido ao mesmo lugar para fazer suas refeições todos os dias ou todas as semanas de suas vidas! Como afirma Wilber, com propriedade: "O processo de translação, por sua própria natureza, tende a rejeitar todas as percepções e experiências que não estão conformes com o princípio básico limitante da própria translação."
O que é orientar?
O ato de orientar pode ser definido de diversas maneiras e não faltam definições nos livros escritos sobre o assunto. Ao invés de trazer mais uma definição sobre o orientação, nós gostaríamos de focalizar os elementos que, juntos, criam o resultado daquilo a que chamamos "orientar". Esses quatro elementos são:
- É um processo. É um processo no qual duas pessoas se reúnem com o sentido de ter uma experiência comum, ou, falando metaforicamente, é um processo no qual duas pessoas concordam em andar na mesma estrada suja de um campo, com buracos e desvios divergentes.
- É o ato de fazer algo conjuntamente. Esse "algo" pode ser simplesmente uma conversa, a transferência de uma habilidade do orientador para o orientado, um desafio lançado pelo orientador, um gesto de apoio, uma prática, uma explicação, ou uma mini-instrução.
- Seu objetivo é o desenvolvimento. O orientador e o orientado se reúnem porque este tem uma necessidade de desenvolvimento que pode ser atendida através dessa relação.
- O resultado buscado é compreendido claramente pelas duas partes. Tem algo a ver com as palavras: ação eficaz, eficiência, aumento de capacidade, desenvolvimento de habilidade, ou simplesmente um esforço para obter uma "segunda opinião". Orientação não é terapia. Também não é aconselhamento, embora este exerça uma papel para o alcance de certos resultados.
Embora a maioria dos autores sobre orientação reclamem o manto da transformação, a maior parte das orientações, tanto na teoria como na prática, permanece puramente transacional. Mesmo o modelo GROW (Landsberg, 1997), muito popular entre os orientadores, é basicamente uma construção transacional (fig. 2).
O que você gostaria de alcançar? (Declaração do Objetivo)
O que está acontecendo na sua vida, neste momento? (Realidade atual)
O que podemos fazer para mudar a situação? (Opções)
De que apoio você precisa? (Conclusão)
A obra de Robert Hargrove, "Masterful Coaching" (1985) é um livro popular muito lido sobre orientação. Ele começa muito bem, fazendo uma distinção clara entre aquilo que ele chama de "aprendizado transacional" e "aprendizado transformacional", uma vez que ambos são abordagens completamente diferentes da orientação. Mas Hargrove perde logo o foco e quase tudo começa a cair sob o guarda-chuva da orientação transformacional. Essa ambiguidade na distinção essencial não ajuda muito o leitor, porque esses dois modos de aprendizado são úteis e até necessários em certas circunstâncias; mas, na essência, conforme Hargrove, eles estão sob o mesmo guarda-chuva. Precisamos, portanto, voltar a Wilber e usar suas distinções no contexto da orientação.
Orientação Transacional
Nesta espécie de orientação, tanto o orientador como o orientado focalizam sua atenção no presente. O que está acontecendo agora? O que precisa ser feito esta tarde, amanhã de manhã? Eles tentam trabalhar basicamente ao redor dos compromissos atuais. O que precisa ser realizado? Eles lutam com elementos de desenvolvimento, mas com uma tarja de "urgente". Que tipo de habilidades o orientado necessita para ter sucesso em seu trabalho, hoje? De que maneira ele pode aprender, fazendo coisas que precisam ser feitas? O que parece ser a solução lógica de um determinado dilema? Como pode o orientado beneficiar-se das relações existentes, que são parte do seu universo? Que regras precisam ser seguidas? Como pode o orientador proteger o interesses mais imediatos de seu cliente?
Orientação Transformacional
A orientação transformacional trata de um conjunto diferente de assuntos. Não é tanto sobre o presente; é sobre o futuro, mas o futuro no tempo presente: como ele aparece agora? Quais são algumas das possibilidades, dada a situação atual? Quais são os novos compromissos do orientado? Que tipo de habilidades ele necessita para atender os novos desafios? Ele é capaz de abordar assuntos importantes com a mente de um principiante – sem pressuposições, lembranças, e julgamentos? Ele pode ressignificar os problemas? Ele pode escanear o futuro – ver o invisível, sobre os perigos espreitando nas sombras? Ele pode ir além da lógica tipicamente Newtoniana para obter discernimentos que desafiam as regras da lógica? Ele pode desenvolver novas relações profissionais poderosas? Ele pode iniciar um novo assunto – conversação centralizada? Ele pode assumir uma posição meditativa? Ele pode pensar com liberdade? E assim segue a lista.
As pessoas que estão recebendo orientação transacional geralmente estão em luta com aquilo que Chris Argyris e Don Schön (1974) chamaram de comportamentos modelo I:
- Eu sou independente e sigo minha própria agenda.
- Eu procuro o controle unilateral de mim mesmo e dos outros.
- Eu maximizo o ganho, advogando minha posição, mas sem atrapalhar os outros.
- Eu sou vulnerável, quando suprimo meus sentimentos e escondo os erros.
- Eu tenho que administrar as impressões para ser reconhecido e evitar parecer incompetente.
- Por outro lado, as pessoas que estão no modo transformacional têm mais probabilidade de encontrar um conjunto diferente de comportamentos que Argyris e Schön chamam de modelo II:
- Eu sou relacionado e construo uma visão compartilhada.
- Eu estou plenamente comprometido com a missão da organização e inspiro esse compromisso para os outros.
- Eu equilibro a argumentação, buscando os pontos de vista de outros.
- Eu sempre aprendo com meus erros e vejo como contribuo para meus próprios problemas.
- Ser bom permite-me parecer bom.
Orientação em PNL
O orientação está se tornando uma parte importante da prática da PNL, particularmente para os practitioners que estão trabalhando com as organizações empresariais. De modo diferente de outros practitioners de administração geral, os profissionais da PNL têm uma compreensão muito melhor de alguns dos processos humanos básicos que são muito importantes na orientação: padrões para a construção de autoimagens fortalecedoras, administração de estados emocionais, padrões de pensamento, resultados bem formulados, acompanhamento, construção de rapport, calibragem, eliciação de estado, ancoragem, ressignificação, mudança de crenças, padrão "como se", e muitos outros atos de mágica com os quais aqueles que desconhecem a PNL nem sequer sonham. Apesar da força aparente de seu conjunto de ferramentas, eles precisam abordar a tarefa de orientar com muita humildade. Sem dúvida, essa é uma tarefa sagrada. Eles precisam participar do sentimento que Ben Ezra expressou no século segundo depois de Cristo: "Eu aprendi a sabedoria com todos os meus professores e o ensino com todos os meus alunos."
Trad. Hélia Cadore
Publicado na revista Anchor Point, Abril 2001
Publicado no Golfinho Impresso Nº 80 de Setembro de 2001