Vivendo com Crianças de Maneira Cooperativa

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sab, 15/03/2003

Qual é o Problema com Nossos Garotos?

"Algo está errado na maneira como criamos nossos filhos." Muitas pessoas, ao ouvir tais afirmações, lembram-se de incidentes como os tiros na Columbine High School. O assassinato é uma das cinco principais causas de mortalidade infantil, nos Estados Unidos. Desde 1925 , o assassinato de crianças entre 0-4 anos aumentou seis vezes, e o assassinato de crianças entre 5-14 anos dobrou. A maioria dessas crianças são mortas por adultos. Um terço delas são assassinadas por seus próprios pais (Pogrebin, 1983). Enquanto um número cada vez maior de países procuram banir toda a violência contra as crianças (seja pelos pais ou por outros), países como os Estados Unidos e Nova Zelândia continuam a permitir agressões legais. A Suprema Corte dos Estados Unidos manteve, aos professores, o direito de infligir severos castigos, que exigem tratamento hospitalar extensivo. Ela declarou que as crianças são especificamente excluídas da proteção da Emenda Oito, que proibia o uso de punições cruéis e anormais (caso de Ingraham vs. Wright ; ver Gordon, 1989)

Letty Cottin Progrebin, antigo editor da revista MS, descreve isso como resultado da "pedofobia" (medo de crianças). Afirma ela (1983, p.42): "A América é uma nação fundamentalmente ambivalente a respeito de suas crianças, muitas vezes com medo delas, e frequentemente punitiva." Ela cita Greg Dixo, líder Indiano, que dá a principal justificativa deste comportamento, dizendo: "A Bíblia instrui os pais a bater em seus filhos com uma vara... os vergões e os ferimentos são um sinal de que um pai está fazendo um bom trabalho de disciplina." O mesmo é verdadeiro na Nova Zelândia. O período de vida em que é mais provável que uma criança seja morta é o seu primeiro ano. Na Nova Zelândia, esse fato responde por 6,9 mortes por 100.000. Nos Estados Unidos, por 9,8 em cada 100.000 (a segunda maior colocação do mundo). Por comparação, nos países do sul da Europa, essa média é de 0,2-0,4 por 100.000. Na Nova Zelândia, nos últimos 20 anos, o número de crianças assassinadas pelos seus responsáveis aumentou em 58%. Essa é uma tendência mundial. (Coddington, 2000).

Mas, de fato, quase todos os pais, nos Estados Unidos e em outros países, estão começando a buscar um novo tipo de relacionamento com seus filhos. Eles buscam um relacionamento de amor e respeito mútuo. Pela nossa experiência, como professores de pais, é somente depois de descobrir a dificuldade em alcançar esse tipo de relacionamento, que os pais aceitam justificativas como a de Greg Dixon.

Naturalmente, os pais mais modernos têm outras explicações para sua dificuldade em criar relacionamentos de cooperação com a crianças. Atualmente, os médicos diagnosticam até 20% de ADD (Attention Deficit Disorder) (Desordem causada por Deficiência de Atenção) (Armstrong, 1997). Entre 1990 e 1994, a produção de Ritalin para controlar essas crianças aumentou 400%. E, no final do período, o grupo de advogados de pais CHADD reclamou que a América estava sofrendo de uma falta nacional de Ritalin (Armstrong, 1997). Em seu clássico estudo sobre a desordem ADD, Russell Barkley (1990) argumenta que o principal problema com essas crianças não é o fato de elas serem incapazes de aprender, mas sim de que elas possuem deficiências específicas em "administrar comportamentos dirigidos" (i.e., elas não fazem aquilo que lhes é mandado!). Para este problema, a nova solução é o Ritalin. Convenhamos, isso é melhor do que bater neles. Mas um número cada vez maior de nossas crianças estão sendo identificadas como severamente perturbadas. Pesquisas feitas sobre "Desordens Depressivas Maiores" revelam que 9% das crianças americanas entre 12-14 anos são clinicamente rotuladas como depressivas (Seligman, 1995). Entre 1993 e 1997, o número de crianças da pré-escola que usavam antidepressivos aumentou 10 vezes na América! 1.5% das crianças americanas entre dois e quatro anos usam antidepressivos, Ritalin, ou antipsicóticos. E isso não é só na América. Na França, 12% das crianças que estão iniciando a escola recebem medicação psicoterapêutica, e dois terços delas usam tranquilizantes fortes e perigosos. (Coyle, 2000).

As Crianças são Humanas?

O tratamento de crianças pode ser colocado no mesmo contexto, fazendo-se um retrocesso sobre as atitudes sociais em relação às mulheres, há um século atrás. Por volta de 1915, as cortes britânicas ainda legislavam que (Wilson, 1983) "o marido de uma mulher importuna ... pode bater nelas em casa, desde que a vara usada não seja mais grossa do que o dedo polegar do marido." (lei que gerou a frase: "como a regra do polegar"). Os médicos e terapeutas concordavam. O Dr. Fritz Perls, modelado pelos que desenvolveram a PNL, orgulhosamente descrevia sua forma de subjugar uma cliente mulher, na terapia, dizendo que ele conhecia"... milhares de mulheres como ela nos Estados Unidos. Provocam e atormentam, irritam seus maridos e nunca são espancadas por eles. Você não precisa ser um Prostituta Parisiense para necessitar disso, a fim de respeitar seu homem." (Pearls, 1969). Tais atitudes em relação às mulheres podem aterrorizar-nos agora, mas elas são livremente aplicadas às crianças. O que pensaríamos de um médico que diagnosticasse 20% das mulheres com ADD por deficiência de capacidade de aceitar o comportamento orientado por seus maridos?

Não há necessidade de um conjunto especial de habilidades para tratar as mulheres. Tratá-las como humanas funciona muito bem, embora doutores como Fritz Perls tenha achado isso difícil de acreditar. Nossa experiência é de que o mesmo é válido para as crianças. Os problemas dos pais em relação a seus filhos não resultam de sua falha em compreender as "necessidades especiais" dos mais jovens. Eles são originados por sua falha em tratar as crianças com as mesmas habilidades que gostariam de usar em outras relações. Quando não se respeita as mulheres o suficiente para ouvir o que elas têm a dizer e para negociar soluções que preencham suas necessidades, muitas vezes elas resmungam, provocam, atormentam e irritam" (para usar os termos dos magistrados ingleses e do Dr. Perls). Esses são os mesmos comportamentos que vemos agora nas crianças, e consideramos "parte de sua natureza". Na verdade, eles são reações da natureza humana, geralmente em relacionamentos coercitivos de ganha-perde.

As pessoas em geral não reagem bem ao uso da coação para controlar seu comportamento. Cada uma delas tem os seus próprios objetivos e gosta de saber que pode alcançá-los. A paternidade coercitiva é baseada na pressuposição de que uma ou outra das pessoas, dentro de uma relação, tem que abandonar seu objetivo pessoal (perde) a fim de que a outra possa atingir o seu (ganha). Naturalmente, um pai que acredita nisso geralmente procura ganhar; tenta coagir seu filho por meio de recompensas e punições. Os resultados são desagradáveis tanto para o pai como para o filho. Um estudo sobre as crianças mostrou que aqueles cujos pais impõem altos níveis de restrição e punição mostram fortes tendências à autopunição, suicídio e propensão para acidentes. Em outro estudo, as crianças com baixa autoestima demonstraram ter pais que usavam mais a punição e menos a razão (Gordon, 1989). E. Maccobyt e J. Martin descobriram que as crianças cujos pais são mais autoritários são menos "conscientes", possuem pouco auto controle e suas reações são mais contidas. (Gordon, 1989).

A coação através do uso de recompensas é minimamente mais bem sucedida do que o uso da punição. De fato, a pesquisa revela que os pais que se utilizam mais da punição, também apelam mais para as recompensas, e vice-versa (Kohn, 1993, p.51). Os pais que fazem ameaças ("Arrume seu quarto senão você vai apanhar") a fim de obter a cooperação dos filhos, também fazem promessas ("Arrume seu quarto e eu lhe dou uma barra de chocolate"), mas nunca inspiram, realmente, amor e respeito. Recompensas e punições são os dois lados da moeda da coação. Um estudo sobre o interesse das crianças em jogos matemáticos mostra o resultado típico do controle infantil baseado em recompensas (Kohn, 1993). Os pesquisadores recompensaram crianças por brincarem com jogos matemáticos escolhidos a esmo, e ignoraram os outros jogos. Naturalmente, as crianças optaram pelas recompensas. No final de 12 dias, as recompensas cessaram e as crianças tornaram-se menos interessadas nos jogos pelos quais haviam sido recompensadas do que eram antes da experiência. Numerosos estudos (Kohn, 1993) mostram que as crianças que são recompensadas por respostas corretas tornam-se menos capazes de encontrar as respostas e passarão a gostar menos das tarefas (seu foco muda da tarefa para a recompensa). Em resumo, as crianças que são coagidas, frequentemente "resmungam, provocam, atormentam e irritam" seus pais e outros adultos.

Existe uma Alternativa?

Virginia Satir foi um dos modelos originais da PNL. Ela conclui o seu livro sobre a educação de crianças (Peoplemaking) enfatizando: "Eu acho que estamos vendo o início do fim do relacionamento entre as pessoas através da força, da ditadura, da obediência e dos estereótipos... É uma questão de saber se as antigas atitudes vão morrer e novas vão nascer, ou se a civilização vai morrer. Estou trabalhando no lado da manutenção da civilização que caminha com novos valores a respeito dos seres humanos. Espero que vocês também estejam." (Satir, 1972). A intenção de Satir, em Peoplemaking era a de inspirar os pais com tendência à coação um relacionamento livre com seus filhos e parceiros. Passados trinta anos, a maioria dos pais concordam que isso continua sendo um desafio para eles. Ao ensinar habilidades de relacionamento cooperativo para milhares de pais no mundo inteiro, nós achamos que muito raramente os pais gostam de bater, ameaçar e obrigar seus filhos à obediência. A maioria deles está desesperadamente procurando habilidades que criem naturalmente relações amorosas, cooperativas, de ganha-ganha.

Essas relações realmente funcionam! Nós afirmamos isso depois de termos criado quatro filhos usando esses princípios. Robert Cedar, da Boston University, revisou 26 diferentes estudos de pesquisa sobre a solução de conflitos entre pais e filhos, pelo método ganha-ganha, e mostrou que é significativamente mais bem sucedido do que todos os outros modelos estudados, especialmente porque aumenta a autoestima e a capacidade de cooperação da criança. (Cedar, 1985). Seis meses após o treinamento no modelo ganha-ganha de solução de conflitos, os pais continuaram a mostrar maior compreensão, sentimentos positivos e respeito por seus filhos; e estes tiveram sua autoestima elevada e acharam que seus pais os aceitavam melhor. Outros estudos mostram que as crianças cujos pais usam métodos ganha-ganha aumentaram os resultados de QI, enquanto os resultados com as crianças cujos pais não ligavam para elas permaneceram estáticos, e os resultados com as crianças cujos pais eram autocráticos realmente baixaram. (Badwein, Kalhoun, and Breese, 1945)

Neste artigo, queremos partilhar habilidades específicas que esses pais estão usando para criar o tipo de família que todos os pais desejam. Além do mais, as habilidades que descrevemos são apropriadas para uso em qualquer tipo de relacionamento. Como resultado disso, essas habilidades fazem mais do que ganhar a cooperação na situação imediata. Ao mesmo tempo, à medida que as usamos, estamos ensinando nossos filhos como criar relações cooperativas saudáveis no decorrer de suas vidas. Vamos usar exemplos de nosso relacionamento com nossos filhos, mas estas são habilidades pessoais, e não "truques" dos pais.

A Chave para um Relacionamento Cooperativo entre Pais e Filhos

O relacionamento cooperativo entre pais e filhos repousa numa compreensão muito simples: As soluções de sucesso são aquelas que são iniciadas pelas pessoas que as desejam, a fim de atender seus próprios objetivos básicos. Leia novamente essa frase. Essa compreensão significa que quando estamos numa relação, é de vital importância deixar bem claro quais são os objetivos de cada um. Na teoria de solução de conflitos, isso se chama identificar a quem pertence o problema (um problema é uma lacuna entre o que você é e o que você deseja alcançar).

Tomemos um exemplo. Os pais querem que seu filho vá dormir às oito horas, todas as noites. Eles acreditam que isso proporcionará à criança o necessário descanso, (um objetivo) o que, por sua vez, tornará o convívio com ela mais agradável (um objetivo). Eles sabem, também, que isso cria a oportunidade de terem algum tempo para si mesmos, a sós, no final do dia (um objetivo), o que, por sua vez, torna mais agradável sentirem-se como pais e parceiros (um objetivo). De quem são todos esses objetivos? Dos pais. A criança pode, ou não, ter interesse em alcançar qualquer um desses objetivos.

O primeiro passo para descobrir a maneira de atingir esses objetivos é identificar exatamente quem os deseja. Soluções totalmente diferentes podem ser usadas se: a) a criança partilhar algum desses objetivos; b) a criança não desejar nenhum desses objetivos. É claro que os pais têm o direito de alcançar esses objetivos. Na paternidade cooperativa, nós enfatizamos que a criança também tem os seus direitos. A paternidade coercitiva do ganha-perde começa quando os pais negam esses direitos. Eles se preocupam com os objetivos que seu filho "deveria" ter, ao invés de reconhecerem quais, de fato, são os seus objetivos. Em seu livro sobre terapia familiar, John Grinder, Richard Bandler e Virginia Satir enfatizam a importância absoluta da liberdade de ver, ouvir, sentir e falar sobre "o que É AGORA, ao invés do que deveria ser, poderia ser, ou vai ser." (1976)

Peguemos outro exemplo comum. Uma criança pequena está brincando com seu jogo de blocos de madeira. Por diversas vezes, ela tenta construir uma torre com eles, mas todas as vezes a torre desmorona, e a criança fica cada vez mais frustrada. A mãe da criança está cozinhando ali perto. Finalmente, em desespero diante de outra queda da torre, a criança começa a chorar. A paternidade ganha-perde começa quando a mãe fica confusa a respeito de quem tem qual objetivo. Algumas mães podem acreditar que, como tal, ela "deve" garantir que seu filho seja feliz e bem sucedido o tempo todo. Alguns pais podem acreditar que seu filho "deve" respeitar a necessidade da mãe de se concentrar para cozinhar uma refeição que a criança possa comer. Esses "deves" podem não ter muito a ver com aquilo que a pessoa realmente deseja.

Fazer com que os blocos permaneçam sem cair pode ser o objetivo da criança. Cozinhar a refeição pode ser o objetivo da mãe. Ambos os objetivos são importantes. Na paternidade cooperativa, estamos interessados em descobrir, antes de tudo, quem tem objetivos básicos. Nosso primeiro interesse é "o que é AGORA, ao invés do que deveria ser, poderia ser, ou será." Uma vez sabendo quais são os objetivos reais das pessoas, interessamo-nos em descobrir como ajudá-las a alcançar os seus objetivos. Um dia, nós nos deparamos com um importante exemplo disso. Uma menina de quatro anos estava tentando costurar um pano, mas o buraco da agulha parecia muito pequeno para ela enfiar a linha. À medida que ela ficava mais desesperada, a mãe dela chegou, pegou a agulha e a enfiou para ela. Explodindo em lágrimas, a menina queixou-se: "Eu não queria enfiar a linha na agulha, eu queria enfiar a agulha na linha!"

Paternidade sem culpa: como ajudar de fato as crianças.

Ajudar uma criança é diferente de livrá-la de um sofrimento. Viver com as crianças de maneira cooperativa envolve o respeito à sua própria capacidade de resolver problemas ou atingir objetivos, e a ajuda para que elas descubram as maneiras de expandir suas habilidades. Quando Francis, filho de Richard, tinha três anos, um dia ele estava correndo de um lado para outro num salão, quando tropeçou e caiu de cara no chão. Indignado, ele olhou para Richard e disse: "Por que você não me segurou?!" Essa falta de compreensão da situação é engraçada numa criança de quatro anos. Num adolescente de quatorze anos é perigosa. Nós nos lembramos dessa metáfora muitas vezes, durante os primeiros vinte anos de nossos filhos. Os que não faziam seu trabalho escolar, queriam que ligássemos para a escola para "livrar a cara deles". Outros, que gastavam grande parte do seu dinheiro comprando um brinquedo, queriam que o devolvêssemos e obtivéssemos a devolução do dinheiro, porque no dia seguinte já o haviam enjoado. Nosso papel, como pais, não é sempre "segurar" nossos filhos. Nós precisamos descobrir maneiras mais adequadas para realmente ajudá-los.

O psicólogo Martin Seligman discute isso, em seu livro The Optimistic Child (A Criança Otimista). Ele enfatiza que a proliferação de livros sobre a "boa paternidade" tem deixado muitos pais com sentimento de culpa. Os pais, acreditando que a felicidade de seus filhos é responsabilidade sua, tentam protegê-los de todo sofrimento. O resultado é a comunicação, para a criança, de que os eventos desconfortáveis ou desafiantes são insuportáveis e perigosos. O medo deles, diz Seligman, cria um sentimento de impotência que é a fonte da depressão. Ele explica (1995): "Na luta para curar a sífilis, na primeira década do século, Paul Ehrlich planejou uma droga, 606, que funcionava envenenando o Treponema pallidum, a espiroqueta que causa a sífilis. Chamava-se 606 porque, antes dela, Ehrlich tentara 605 outras drogas, das quais nenhuma funcionou... As crianças precisam errar. Elas precisam sentir-se tristes, ansiosas e zangadas. Quando nós protegemos impulsivamente nossas crianças de suas falhas, impedimos que elas aprendam 606 habilidades... E se nós impedimos que elas aprendam, enfraquecemos sua autoestima da mesma maneira como se as tivéssemos diminuído, humilhado e maltratado fisicamente todas as vezes."

O auxílio realmente efetivo não nega a dor. Ele ressignifica a situação de modo que a dor, enquanto reconhecida, tem um significado muito menor. No verdadeiro sentido, Paul Ehrlich nunca falhou totalmente; ele continuou a utilizar a experiência obtida até alcançar seu objetivo. O Dr. Milton Erickson, um dos terapeutas especialistas estudado pelos que desenvolveram a PNL, dá um exemplo muito claro disso (Rossi, ed. 1989). Um dia, seu filho Robert, de três anos, caiu de uma escada, cortou o lábio e enterrou um dente na gengiva. O menino chorava de dor e terror, olhando para o sangue que se espalhou por todo o pavimento. O primeiro comentário de Erickson foi: "Isso dói muito, Robert! É uma dor terrível." Robert meneou a cabeça, gritando apavorado. Erickson continuou: "E vai continuar doendo. E a gente realmente quer que pare de doer." Robert meneou a cabeça novamente, sentindo que seu sofrimento fora completamente compreendido. "E a gente não sabe se vai parar em um minuto, ou em dois minutos," disse Erickson. Robert concordou. De fato, foi isso que aconteceu. Erickson continuou, apontando o sangue que havia apavorado Robert : "E tem um monte de sangue no pavimento."

Até então, tudo o que Erickson havia feito fora o acompanhamento verbal, falando sobre os pensamentos e medos profundos de Robert. Ele teve toda a atenção de Robert. Milton continuou: "É um sangue bom, vermelho e forte?" Uma pergunta suficientemente inofensiva. Robert não tinha certeza. Milton explicou que se fosse um sangue bom, vermelho e forte, a água ficaria rosada quando lavassem seu rosto. Foram para o banheiro, e lavaram o rosto de Robert e, claro, a água ficou rosada. Robert ficou muito impressionado. Milton começou a falar, então, sobre os pontos que Robert ia levar, igual a seu irmão mais velho, Allan e sua irmã mais velha, Betty Alice. Milton, então, começou a especular se Robert levaria mais pontos do que eles tinham levado. Robert ficou muito curioso a esse respeito. Ele estava, agora, totalmente ocupado em criar o objetivo de cura.

Otimismo Aprendido: Ressignificação do Poder

A pesquisa de Seligman mostrou que as crianças que são fundamentalmente felizes interpretam os resultados positivos da vida e os desafios de uma maneira especial. Elas pressupõem que os resultados positivos são permanentes (este bom resultado vai continuar), abrangentes (este bom resultado vai afetar muitos outros eventos) e pessoais (este bom resultado é uma evidência de que eu sou bom). Elas pressupõem que os resultados negativos são temporários (este desafio vai passar), específicos (este desafio afeta unicamente uma pequena área de minha vida), e situacionais (este desafio é resultado de alguma coisa numa situação especial). Ele chamou essas pressuposições de estilo explicativo otimista. As crianças que ficam deprimidas em crises, fazem pressuposições opostas – por exemplo, que as coisas ruins estão sempre acontecendo a elas porque existe algo fatal em sua natureza, e esses eventos ruins vão arruinar tudo. (Seligman, 1995).

Os pais, nota Seligman, podem instalar um estilo explicativo otimista em suas crianças, mostrando que os problemas são temporários, específicos e situacionais. No exemplo de Erickson e seu filho Robert, Erickson acompanhou a percepção pessimista da crise de Robert (que Robert temia fosse permanente e o tivesse prejudicado profundamente) e depois comunicou que:

  • A crise de Robert era temporária (um ou dois minutos, de fato).
  • A dor de Robert era específica e situacional (porque Robert possuía um bom e forte sangue vermelho, esse sim, um recurso permanente e abrangente).

Erickson enfatizou (Rossi ed., 1989) "Em nenhum momento ele ouviu uma afirmação falsa, nem foi forçado a acreditar de forma contraditória à sua compreensão.

A mesma ressignificação pode ser usada quando os próprios pais têm um problema de comportamento de seus filhos (por exemplo quando eles querem que seu filho vá para a cama mais cedo, ou não interrompa enquanto estão cozinhando). Dizer: "Johnny, você está sempre ficando acordado até tarde, e tem tanta preguiça de manhã. Qual é o seu problema?", obviamente ensina uma estilo explicativo muito diferente de: "Johnny, eu entendo que você queira continuar brincando. Mas achei difícil, quando você ficou acordado até mais tarde, na semana passada, e de manhã disse estar muito cansado para se levantar. Eu gosto mais quando você é capaz de aprontar-se com prazer para ir à escola, de manhã." Dizer: " Será que você não entende como é difícil para mim cozinhar essas refeições? Eu gostaria que você não fosse tão egoísta." transmite um estilo explicativo muito menos otimista do que: "Eu sei que você quer uma ajuda para formar a torre com seus blocos. Realmente, é muito frustrante. Eu mesma estou tendo um problema agora, porque estou cozinhando. Depois, posso ajudar você. Que outras ideias boas você teria para agora?" Este processo de transmissão de poder através da ressignificação também é discutido por Connirae Andreas, na série de audiocassette Successful Parenting (Paternidade bem sucedida) (1992).

Até o presente, temos considerado a maneira de ajudar as crianças quando elas têm alguma preocupação. No próximo número do Golfinho, vamos continuar este artigo, considerando como responder a situações em que os pais é que têm uma preocupação com o comportamento de seus filhos.

Continue lendo: Vivendo com Crianças de Maneira Cooperativa 2ª parte

Publicado na Anchor Point, Maio, 2000.
Tradução: Hélia Cadore
Publicado no Golfinho Impresso Nº 67 de AGO/2000

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